Desconexão

22 de março de 2016

Foto: Danny Roozen













O cerco se fecha diante dos olhos, conduzindo nossos mais fidedignos apelos por caminhos estreitos. Há momentos em que apenas viramos elos fugidios de uma arquitetura muito além da nossa compreensão. Culpa da escassa frequência que nos desalinha ao sussurro humano, e proporciona calor à frieza dos dias vazios. Debatemos em meio aos meandros pelas quais somos aniquilados, salientando sonhos, costurando emoções e desvencilhando as vestes aquiescidas pela sombra da dúvida. Nem sempre fica tudo explícito. 

Giramos o rosto e não conseguimos mensurar a nitidez de um mundo que adoece; investigamos rostos difusos, e paisagens abstratas, elementos carentes de assimilação. Situações caem ao colo, mostrando que há ainda encantos, porém, por escombros pouco aparentes. São raros os momentos em que não nos sentimos distantes, desconectados dessa trilha em que a vida, calidamente, nos coloca. Os passos anseiam terra firme, clareza nas emoções; a alma mira um encaixe, abraços indulgentes e apelos francos. 

Os olhos caminham vazios, em uma vã tentativa de esmiuçar sentimentos concretos, de desentrelaçar os nós que surgem enquanto perdidos. Falta consistência, elementos que conduzam energia à nossa ‘fiação’ interna. Não há consonância. Trilhamos os dias à espreita, vítimas de rompimentos que nos desligam do essencial; que nos jogam paralelo às curvas do mundo. Mal distinguimos um passo à frente. Tudo anda muito desfocado e fora do lugar, com cores desbotando e melodias emudecendo. 

Padecemos em esporádicas alegrias, denotando a fraqueza que se delibera por corpos cansados. Os mecanismos vitais parecem falhos, desunidos. É esta sensação que preenche o íntimo, que nos cerca em profunda sonolência, como se quase tudo tivesse perdido a vivacidade e o brilho. Não há mais aquele torpor, aquela emoção que sorri discreto dentro da gente. Porque as calçadas andam vazias por demais; os corações repletos de ar, apenas. Cadê a essência que dá vida? Só visualizamos ruas silenciosas, multidões que não se encontram por estarem tão desligadas de si.



Aspas do Autor: Meio perdido. Mal consigo andar nessas linhas tortas da vida...


4 comentários:

Unknown disse...

Que lindo! Isso me lembrou um tema de redação da Unesp que eu falei sobre essa desconexão que sentimos perante o mundo, para mim acho que estamos muito conectados e não olhamos mais para a família e amigos, isso causa esse desligamento.

http://dezoitoemponto.com/

Bandys disse...

Ola Ale,

Quem não precisa de pausas?
De suspiros?
De se desligar de vez enquanto?
É essencial meu gato.
"Na vida e no amor, não temos garantias.
Portanto, não procure por elas. Viva o que o tem
que ser vivido. Sem medos. O medo é um dos
piores inimigos do amor e da felicidade.
E com ou sem pausa nunca deixe sua essência escorrer pelos dedos, a não ser se for
pra pintar poesias de amor. :))
Beijos

Te amodoro

Ariana Coimbra disse...

Ando muito desconectada das pessoas, do mundo, das coisas, mas ando mais conectada a mim mesma, ao meu eu interior.

Lindo texto Ale!
Saudades!

Beijo

Jaya Magalhães disse...

Amigo,

Eu já me sinto assim há tempos. Já tentei escrever sobre, mas ainda não consegui colocar em palavras a agonia que é, em fases, viver no mundo e sobreviver a ele. Essa desconexão tem várias vertentes e o seu modo de enxergá-la e dividir foi muito bem pontuado. Como sempre.

Obrigada pela leitura que proporcionou. Deixei muito de mim nas tuas linhas.

Um beijo grande.