Ilustração: Roberto Weigand |
Um deslize e escorregamos, tombamos da tênue corda onde nossa diminuta alma caminha. A cada choque com o chão, estilhaços [de nós] saem como fugitivos amedrontados. Diante de tantas testemunhas, o impacto no solo não é só doloroso, mas vergonhoso. Não há meios de voltar sem sequelas, sem afetação, sem que sintamos desconforto. O retorno se dá com treino adequado e intenso. Apenas com muita disciplina encontramos o ritmo e a sintonia do equilíbrio.
Não nos é permitido vantagem, sequer uma moleza que nos encaminhe ligeiro ao organismo das lições, menos ainda algum suporte diante das fraquezas, de nossas falhas repentinas. O espetáculo segue ininterrupto e a plateia não suporta pausas, a programação não se altera e nada se adequa às nossas limitações, tampouco há reestruturação na estrutura do palco. Quando na corda bamba, estamos apenas sobre nossas próprias forças.
Andamos sobre corda bamba o tempo todo e o processo de aprendizado é longo, as quedas são inúmeras, principalmente as lesões. Algumas dores ecoam profundo, atingem tecidos internos da alma, a engenharia íntima dos nossos sonhos sofrem fissuras, em efeito à realidade da superfície tão dura. O caminho para a tranquila passagem sobre os fios poéticos da vida é antecedido por muita reflexão, por embates que põe nossa consciência diante dela mesma, quando os limites espelham-se em si e percebemos as rotas para melhor ser.
Cair traz o choro cristalino do discernimento. Aprender é olhar para dentro, é extrair dos olhos o alcance que cada espetáculo nos exige. Crescer é saber adentrar o pequeno confinamento onde ficam nossas esperanças desenhadas e residem as capacidades a serem aprimoradas, as pedras brutas a serem lapidadas. Por mais que certas condições frustrem, nos coloque solitários diante dos desafios e do mundo, apenas nos tornamos humanos ao persistir no equilíbrio, nessa tensão que é estar sobre a corda bamba em que a vida nos põe.
Escorregar da corda é condição inseparável ao aprendizado, e por mais que, como fuga, estar no chão seja cômodo às vezes, subir de novo na corda em busca de equilíbrio, a despeito de qualquer balanço assustador ou baque doído que possamos sofrer, é imensamente gratificante.
Aspas do Autor: Essas palavras nasceram após eu despencar bruscamente da corda... Mas, sigamos em frente.