Às vezes é difícil entender uma pessoa. E ficamos a nos indagar, a buscar incessantemente meios para compreender um pouco os contornos alheios. Mas o escuro corredor humano se torna intransponível quanto mais tentamos adentrá-lo à força. Quanto mais ansiamos entender, mais denso se torna o caminho, mais distante ficamos do pouco a ser desvelado. A gente começa a entender no momento em que aceitamos não perceber; ao insinuarmos os olhos para outra direção, a do coração.
Não é preciso esforço pra entender ninguém. Entender, nada tem a ver com esforço, mas com sensibilidade. É um desbravar sutil permitido pelos olhos da alma. É algo que exige mansidão, uma exímia doçura e leveza nos gestos. Entender é uma ação que se sobressai na pura espontaneidade de corações que se simpatizam, ou no encontro natural de dois olhos cúmplices. Talvez seja necessário apuro e paciência, um escutar aguçado, uma atenção cheia de lisura, mas jamais uma vontade estrita.
Não é preciso empenho, como se entender residisse no ato bruto de abater um muro, de o quebrá-lo com as mãos nuas e famintas pela humanidade íntima que se encontra do outro lado. Entender alguém está mais relacionado ao adormecer, ao recostar da mente no seio macio do travesseiro que seduz nosso sono. É na renuncia externa, no simples descanso, na esmera forma de entranhar a alma que o sonho acontece e o entendimento cintila, perpetuando-se solene e sutil dentro de nós. A compreensão é um sonho que se vislumbra na mente quando menos esperamos. É algo que acontece e não se força a nascer.
Para entender é preciso primeiramente não querer, mas sentir, se enlaçar no rastro que a pessoa deixa pelo ar, no segredo que ela deixa implícito no semblante, nos gestos que se acentuam, pela legítima maneira de se expressar, de se mostrar humano. Não é preciso afinco desesperado, mas um zelo dócil possível de se exprimir num sorriso que abraça em plena ternura. Compreender o ser humano é permitir-se esquecer de que anseia entender e se deixar incendiar pelo amor e respeito. E isso nos permite encontrar, espontaneamente, o prumo certo do íntimo de cada um.
Respeitar as condições alheias, as diferenças que a alma da pessoa denota é o primeiro passo para descobri-la, para inteirá-la; é olhá-la como se olhássemos para nós mesmos, como se a vida dela fosse a nossa. A compreensão escapole quando tentamos analisar. A alma humana é arredia, e se torna arisca quando tentamos amarrá-la e delineá-la. Só se aproxima dela se afastando ou ficando à margem. O entendimento chega abraçando e nunca é abraçado. É a alma da pessoa que dá boas vindas e convida-nos a adentrar no seu salão.
Entender o ser humano é um pouco igual ao que faz um psicólogo, alguém que não deseja cruamente analisar, mas se propõe somente a sentir, a ouvir, a adormecer no colo da pessoa e a sonhar junto com ela. Ele se interage dentro da outra alma sem invadi-la, sem concretamente se aproximar, apenas se extrai e se preenche em si para que o outro lhe encontre naturalmente, permitindo, nesta sutileza, uma afetuosa cumplicidade surgir, um laço se formar com fluência, sem uma mínima coação.
Não é difícil entender ninguém, quando nos conformamos que isso não é algo que se impetra na busca, mas na espera despretensiosa, na delicadeza em sentir, em se compenetrar na personalidade rica do outro; na livre condição em que a deixamos; na confortável companhia que oferecemos e na sintonia que se cria nesta troca cúmplice, que nasce por si só, como uma intervenção furtiva do destino...
Aspas do Autor: Entender as pessoas parece uma coisa realmente complexa, mas repetindo o que falo no texto, a harmonia com a alma alheia simplesmente se faz sem que se force isso, sem o desejo de entender... Ela brota, nasce do respeito, primeiramente... Enfim, este texto é apenas uma maneira particular de pensar. Não me utilizo de fontes científicas, estudos sobre as relações humanas, muito menos tenho pretensão de torná-la uma coisa totalmente certa ou absoluta, por isso. Até porque não é minha intenção. Foge do intuito do meu blog, que é apenas delinear sentimentos. É apenas uma percepção que meu coração nutre. Um ângulo visto com os olhos internos. São letras escritas pela alma... A fonte dos meus argumentos é a sensibilidade e a humanidade que tenho adquirido ao longo dos anos no meu modo de olhar as pessoas e nas relações que cultivo... Por isso, é um texto pra ser lido com mente aberta. Abraços!