Nuances...

24 de setembro de 2011





Sou um misto de ansiedade e calmaria. Alterno entre altos e baixos. Sou balança que oscila em busca do equilíbrio. Sou apenas um humano em busca de entender as razões de ser o que sou; as nuances envolto à grandeza que acolhe a minha frágil existência e ao meu modo especial de ser e sentir. Contudo, sou muito perspicaz para identificar o que se afunila no peito, as chagas que moram em mim, e as dádivas que me dão cor. Saber dói. Mas não saber seria como morrer lentamente sem intuir. Procuro elementos que me façam curar. Meios para evidenciar e conduzir o meu melhor. A lapidação é diária. Sou aluno de um professor rígido. Estou na primeira matéria.

Ao olhar além, eu me encontro. Delineio a armadura dos céus que cercam o meu universo. Por trás dessa muralha azul é que noto as estrelas que, bonitas, de encanto inigualável, revestem o céu do meu mundo. Sorrir é um ato fácil. Sentir a leveza da pureza divina me abraçando é de um prazer imensurável. É ali que encontro uma calmaria, uma motivação para continuar a sorrir, a seguir meus passos por este deserto que por vezes me encontro. É o olhar no horizonte que me depara com algumas respostas para amansar o anseio; aliviar as aflições que permeiam solenemente minha alma; pra sentir companhia.

Sinto-me só no momento em que percebo olhar para cantos que poucos enxergam; quando vejo minha alma suspensa num vasto mundo em que poucos adentram, em que poucos acreditam ou sonham; em um deserto onde sinto meus pés cansados afundarem, sozinhos. Sou daqueles que veem nuances onde a maioria só vê o bruto, a couraça. Posso dizer que quase consigo enxergar o vento, o sopro arredio que perpetra pela alma, nos trazendo o sabor fino e doce do amor. O que não é perceptível a muitos, é visível a mim. Consigo ter sintonia com as diversas gradações que rodeiam as almas; que ficam no entorno da vida; à margem dos desejos e sonhos; no profundo mais íntimo do interior, escondido pelas camadas da pele.

A minha sensibilidade é aguçada o suficiente para poder interpretar com doçura os tons que colorem o ambiente ao redor. Comovo-me em poder visualizar, com a íntegra magia que nasceu em mim, as matizes de sensações que perpetuam por entre os poros de cada ser humano. Desvencilho as cortinas que cobrem os atrativos e pairo meu olhar naquilo que realmente importa, fascina, cativa e atrai. Dou passos cautelosos pelas calçadas alheias, piso com firmeza no coração das pessoas e, de maneira natural e singela, eu consigo desembaraçar as vestes das almas. É difícil compreender o território humano. É para poucos. Mas eu decidi firmemente a me aventurar nesta difícil arte de descosturar a pele das pessoas e sabê-las por dentro. É ao mesmo tempo, um autoconhecimento.

Vivo num território há muito abandonado. Aquele em que o esplendor se multiplica em gradientes de magia; em explosões sublimes de fulgores que indicam o caminho. É difícil estar e não estar. Porque o que sinto e acredito é multifacetado, como um arco-íris de possibilidades refletidos por um prisma, ou pela colisão sutil dos raios de sol com as gotas de chuva. A imensidão que sou capaz de enxergar às vezes me assusta, deixa-me solitário. Sou muito diferente do que se acentua pelas esquinas. Porque sinto o queimar do incenso dispersar pelos cantos mais obscuros um aroma infinitamente aprazível. Há razão em tudo o que faço e sinto. Não faço escolhas aleatórias.

Eu enxergo nuances quase nunca vistas pelos outros. Sou um ser deslocado no mundo. Persigo encantos que quase ninguém mais recorda que existem para sentir. Vivo num mundo errado, que não bate com os meus mais doces e sutis desejos; em que não me sinto próximo daquilo que me encanta. Sinto-me longe, sempre. Porque só lá, no firmamento, parece conter os tesouros que minha alma tão díspar quer descobrir; os segredos que busco revelar; os sentimentos que aspiro abraçar. Tem horas que não dá para suportar o peso deste destoar, desta diferença que me põe à borda de tudo.

Estou só em meio à multidão, na contramão da via comum. Encontro-me nos detalhes mais sensíveis, mais discretos e em tudo que fica paralelo ao mundo. Espalho no ar a minha fragrante inocência, meu jeito criança em não ter malícia e do meu modo verdadeiro e único de se preencher com as miudezas encantadoras. Entrego-me de verdade nos sentires, nas sensações inspiradoras; levo sempre no peito a explícita verdade que há em mim, sem máscaras ou molduras belas que ofuscam a pintura. Visto-me com a minha pele transparente, exponho o brilho do meu coração, e deixo no olhar a essência que me define. Danço num ritmo que se chama sensibilidade, num sentir que aguça o olhar do coração.

Às vezes choro sozinho tentando compreender o porquê de ser tão distinto, de querer o que poucos hoje em dia querem, de acreditar naquilo que o mundo deixou de crer. Sou de ideologias que há muito aposentaram, de sonhos que há muito se perderam pelas veredas humanas; de gostos que hoje talvez pareçam arcaicos. Um alguém só, em meio a um espetáculo de nuances dispersas e esquecidas pelos corações alheios, e que me dão um pouco do combustível para viver. E mesmo em meio à ansiedade e a esta aparente solidão, sempre fico à disposição do tempo, fluindo meu ser na espera pelo sutil desenlace do nó; do breve desembrulhar do pacote; no lento desabrochar da flor que desponta no meu jardim e no gradual amanhecer que o sol faz acontecer.

Minha alma, mesmo em torrentes de pressa, no fim, fica a vagar pausadamente pelo sabor inócuo do ar, em busca do enlace formoso do amor, do seio para se aconchegar; da mão firme para poder segurar... Um mundo para se encontrar...





Aspas do Autor: Afirmo em dizer que este é, dentre todas, e até hoje, a escrita que melhor esmiuça o que sinto, o que vivo, o que sou e o que há em mim. Uma aproximação sutil, em meio às limitações das palavras, da minha alma. Diante do que absorvo e exalo, creio que sou um ser que necessitaria ter um ou mais corações de reserva (risos).

Renasceu

17 de setembro de 2011




Adormecia
Nas franjas da dor
No oculto do silêncio
Em um vazio abrasador

Morria
Numa insólita agonia
Tempestade dolorida
Que o peito cobria

Renasceu
Em encanto e esplendor
Para voar distante
Bem longe do temor

Renasceu
Das cinzas uma flor
Sentimento despertou
No colo de um amor





Aspas do Autor: Coração leve, sorridente, feliz... Muito feliz!

A moça dos olhos infinitos...

3 de setembro de 2011




A noite sibilava encanto. Um canto. Melodia. Era um mundo que exalava. Damas da noite em sintonia. Expelia pelo ar notas musicais. Ecoava amor. Sob a luz do luar a vida regia uma beleza jamais vista. Era mistério e nada menos. Era demais, puro enigma. Outro plano, outro universo. Outro mundo. Estava no paralelo aos reinos da doçura e da alegria; mas cruzava os do amor e da brandura. Um mundo residente na galáxia da alma, com um satélite de coração. Lugar distante, num inócuo existir. Um reino de sentir, de intenso e sorrir. Não havia nome, apenas existia. Um mundo sem fim. Infinito no ir.

Um habitante apenas. O maior de todos os segredos. Uma moça. A pura e estrita essência daquele mundo personificada numa mulher. E a essência era divina. O que a tornava a representação literal da beleza, o retrato de todas as belezas em uma. A beleza das belezas. A musa absoluta. A Eurídice de Orfeu; a Dulcinéia de Dom Quixote; a Roxane de Cyrano; a Isolda de Tristão; a Capitu de Bentinho; a Monalisa de Da Vinci; a Julieta de Romeu... Ela era o apogeu das aspirações, a imagem única de todas as musas. O homem que amava uma mulher, irremediavelmente a amava. Era inevitável.

Mas seu mundo era tão poeticamente infinito, que colidia no fim dos fins. Chegar a entrar nele requer muita destreza e obstinação. Acima de tudo sensibilidade, leveza e uma serenidade singela, infante. A chave para este adentrar era simples, mas intrincado; um detalhe, mas imensamente complexo: a permissão dela. Muitos padecem apenas ao se aproximar da órbita. Respirar o oxigênio do seu mundo requer um coração intenso, forte, porém simples, afável e manso, perfeitamente em sintonia com um amar pujante, doce e terno. E talvez um pouco de suavidade...  Nem muito, nem tão pouco. Apenas o verdadeiro.

Porém, mesmo diante de tantos obstáculos, foi naquela noite. Noite em que o encanto sibilava em canto. Um cometa. Do nada. Rompeu a atmosfera. Adentrou de repente naquele mundo. Invasão ou permissão? Permissão. Atmosfera enfraquecida, chave encontrada, permissão concedida. Mesmo que inconsciente. A moça sabia. Um moço ali surgia. Sem eira nem beira, um transeunte do espaço sideral, um náufrago em seus próprios sentimentos. Mas um verdadeiro simplista no sentir. E por isso mesmo com grandeza. Levava no peito a leveza de um querer soberano, a inocência de um sorriso que ansiava e atraía. Na ponta dos dedos carregava a mais pura poesia. No coração circulava mel de amor, fabricado pelas melhores abelhas. Era um moço de singela apresentação, mas inteiramente autêntico.

Acordou diante uma noite de lua cheia. De beleza em sintonia, de melodia a ecoar. Um risco ou oportunidade? Quem vai imaginar? Ele percorreu o mundo, praticamente encantado. A moça o via, mas escondia seu maior segredo. Seus segredos. Um mundo aberto, mas mistérios espalhados. Tesouros trancafiados. Seus olhos? O maior de todos... Porque ela guardava o infinito neles. A formosura de todas as musas estava pintada nos seus olhos. Olhar ali era desaguar a alma numa constante sensação, numa infinita constatação; num amar eternamente... Por isso ela guardava seus olhos. Porque temia. A luz era magnífica. Imensa. Olhar de candura incomensurável.

O moço a encontrou várias vezes. Mas ela se escondia. Eles conversavam algumas vezes, mas ela não se revelava por completo. Muito menos mostrava os olhos. O moço não entendia. Ela consentia. O mistério rondava aquele mundo. Ela. O moço era certo disso. A moça de encanto mágico o instigava. Ela seduzia sem querer. Singelo e natural. O coração do moço se estimulava. O mundo dela, ele esmiuçava. E assim descobriu alguns segredos. Isso significou conhece-la mais a fundo. Significou respeitar e compreender o que se estende ao longo daquele universo que reluzia em enigmas. E isto o cativou.

Eles se viam e riam. Ele roubava risos dela. Ela furtava magia dele. Havia um desenlaçar naqueles encontros. Medo esvaia. Insegurança que exauria pelas veredas da dor. Num desses embates sublimes, ela cometeu um deslize. Seus cabelos escaparam seus olhos. Seu olhar. Ele a fitou. Apaixonou. Emudeceu. Coração encantou. Encanto nasceu. Firmou, no horizonte do âmago, a paisagem de um amor. Reluziram no espaço cometas de indelével sabor. Ela percebeu. Lágrima surgiu. Um símbolo do temor. Fugiu para se preservar.

O moço paralisou de emoção. Quis persegui-la, mas não conseguia. Após um tempo começou a procura-la. A gritá-la. Mas ela esvaneceu. Ele amava. Viu nos olhos dela o infinito de um amor. Um oceano castanho que colidia com um céu esplendoroso. Um céu infinito. Ele não sabia dizer o que sentia e percebia. O olhar dela guardava o infinito. Eram olhos de infinito. Cabiam neles sentimentos infindos. Tão intermináveis que foram morar nos olhos do moço. A imagem dela se tornou pintura nos seus olhos. Inapagável existir.

Ela surgiu após um tempo. Não escondia mais os olhos. Fitava o moço com um carinho especial. Mas ainda era mistério. Falava pouco. Mas ria docemente, às vezes. Brilhava. Os olhos dele respondiam. Encanto surgira. Ela temia. Ou queria? Ela se perdia... A beleza estava instável, à deriva. Foi consumida. Ela não sabia. Desconhecia. O moço era emoção. Mas sentia o medo nas mãos. Foi consumido, impregnado pela essência da moça. Não se falavam, mas diziam tudo. Um ao outro. Ele se perdia. Queria. Amava. Sorria. Encantava. Mas não dizia.

Ela despediu. Ele chorou. Pingos de chuva caíram do céu. Salgadas. No oceano ela se jogou. Foi-se. Encontrar-se? Quem sabe? Ele a seguiu. Ao olhar no mar, ele a viu. Os olhos da moça ali, refletidos. Maestria doce e solene. Ele a amava. E ela? O amava? O amaria? Ele nunca iria saber. Afundou-se naqueles olhos, naquele mar de castanho abundante... Morreu nas águas dela. No olhar infindo... Nos seus olhos infinitos.





Aspas do Autor: Eu procuro estes olhos... Este olhar...