A cidade que não sorria

25 de dezembro de 2010

Ela vinha de longe, de muito longe, quando se deparou com uma linda cidade. Não era grande, tinha ar de interior, mas exercia um encanto que ia além de qualquer simples percepção. Ela sorriu ao vislumbrar a beleza que se ostentava pelos cantos daquela cidade. A moça apenas ficou intrigada ao ver que a cidade parecia um deserto. Não avistou muitas pessoas. As poucas que apareciam, não demonstravam muita simpatia, e fugiam ao vê-la.

Ela pensou que por ser estranha era normal desconfiarem. Mas ousou falar com uma garbosa mulher que passava pela rua. Tinha a cara fechada, parecia extremamente irritada. Ao notar a moça estrangeira, deu um salto de susto. A moça estava sorrindo, com um encanto que podia tranquilamente afagar qualquer coração. – Oi! A habitante da cidade, ao encará-la correu gritando por socorro. A moça não entendeu. Em poucos minutos viaturas de polícia apareceram na rua e guardas muito enfezados a abordaram. – Prendam-na! Gritou um dos guardas. – Pare aí estranha, você esta presa!

Ela sem entender nada tentou em vão saber o que tinha feito. Quando os guardas a pegaram, ela gritou desesperadamente: – EU NÃO FIZ NADA! SOLTEM-ME! Ela esperneava nas mãos deles, mas não adiantava. Eram fortes. Enquanto isso um aglomerado de gente, apareceu num instante para presenciar a então criminosa. Era um buchicho enorme em relação à moça estranha que tinha acabado de chegar à cidade. E ela continuava sem entender nada.

Na prisão, ela foi levada à sala de interrogatório. Minutos depois um homem, de terno azul escuro e com uma maleta, entrou no recinto. Parecia ter cara de poucos amigos. – Bom dia Senhorita, sou quem vai cuidar do seu caso. E adianto que você está em apuros. Foi-me relatado que a vítima foi atacada por você. Você fez um dos gestos mais hostis que existe, e ela sentiu-se violentada!

A moça, desesperada, ouvia revoltada e sem entender nada o que o investigador dizia. – Eu não fiz nada! Não movi um gesto a ela, a não ser ter cumprimentado-a educadamente. O investigador não demonstrou acreditar muito. – Ela disse que você sorriu. Vai mentir que não? Interpelou-a rispidamente. A moça ficou estupefata e surpresa: – Sorri sim, mas o que isso tem a ver? O homem não gesticulou nada, mas disse num tom ameaçador – Ora ora! Pelo visto você está realmente encrencada. É proibido sorrir nesta cidade. É um gesto destruidor e que causa muito mal às pessoas. É punido com a morte.

A moça ficou horrorizada com o que ele disse. Um sorriso, um mero gesto inocente, encantador, capaz de trazer doçura e paz a um coração, ser considerado um gesto criminoso? Era completamente absurdo acreditar em uma coisa dessas. Pior ainda aceitar o fato de existir um lugar em que se proíba este ato tão terno, que dá leveza a todos. – É um absurdo isso. O sorriso é o reflexo da felicidade que transborda dentro de nós. É a expressão espontânea da alegria imersa na alma. Quando nos sentimos bem, ou estamos diante de quem gostamos, sorrimos. O moço olhou incrédulo para ela: – Asneiras! Nunca sorrimos nesta cidade e sempre vivemos bem. A moça surpreendeu-se. – Eu realmente duvido. A vida de vocês deve ser muito triste.

O homem não respondeu nada, mas podia ver que ela era uma moça de fibra, e que emanava uma essência boa. Ele sentia algo bom. Isso o desconcertou. – Er... bem, amanhã é o seu julgamento. Mas suas esperanças são nulas. Será condenada. E saiu logo em seguida. Parecia um pouco perturbado.

A moça não se conformava com aquilo. Era algo inacreditável. Ao mesmo tempo sentia pena de quem morava ali. Nunca sorrir ou nunca ver um sorriso devia ser algo extremamente debilitante. Ela também temia o julgamento. Ser condenada à morte por sorrir era algo surreal. No dia seguinte ela foi encaminhada ao julgamento. A cidade inteira estava ciente. E a maioria estava presente nas ruas e em todos os lugares para presenciar o julgamento da criminosa. Ela se acomodou no salão de julgamento. Muitas pessoas estavam ali.

Ainda não tinha começado a audiência, e a possibilidade de ser condenada à morte fez a moça pensar em coisas boas, em lembranças felizes da sua vida, por tudo de bom que passou, aprendeu e ensinou. Passou pelas memórias que a deixava feliz. E isso a fez sorrir. E ela sorriu como nunca sorriu antes. Mostrou seu sorriso encantador a todos os presentes ali. Sem medo nenhum de evidenciar a grande felicidade que ostentava na alma, justamente por ter tido uma vida muito alegre.

“OHH!” A maioria se horrorizou como se estivessem sofrendo um atentado gravíssimo às suas vidas. A verdade é que nunca ninguém tinha visto ou feito um sorriso, e viveram com a ideia de que era algo horrendo. Foram minutos repletos de desespero. Os guardas dirigiram-se a ela para impedi-la. Taparam a sua boca. Muitos saíram do local. Diante de poucas pessoas, consideradas corajosas e fortes, o julgamento se agravou, e o Juiz decidiu pela condenação à morte imediata da então criminosa.

Infelizmente não houve salvação para ela. No dia seguinte ela foi enforcada, diante de muitos presentes. E ali morria uma pessoa culpada apenas por oferecer uma das coisas mais belas do mundo. E que muitos, por terem um coração de pedra, e fechados para a felicidade nunca compreenderam a ternura presente no gesto. Mas de qualquer forma já era tarde demais. No julgamento, enquanto ela sorria, e dentre os muitos ali, algumas foram realmente tocadas com o poder do sorriso, que ao contrário do que pensavam, era um poder benéfico. Era realmente destruidor, mas destruidor da amargura, da grande escuridão presente no coração. O sorriso dela foi suficiente para tocar o coração de algumas pessoas.

Houve ainda muitas condenações, mas o sorriso continuou se espalhando, e logo as pessoas que sorriam se tornaram maioria naquela cidade, que agora sorria graças à herança deixada pela moça estrangeira.



  

Aspas do Autor: Ando sem tempo, sem internet e sem muita cabeça para escrever. Acho que em breve despeço-me daqui para umas férias. Umas férias do blog para eu poder respirar e poder renovar um pouco a minha mente, e poder voltar com a alma reformulada, e com textos mais inspirados. Espero que entendam. Um feliz ano novo para todos. Meu carinho!

Viver!

11 de dezembro de 2010




Viver bem é uma arte! Arte possivelmente daquela bem traçada, ao estilo Picasso, sem muita frescura, direta e sem rasura. Viver bem não é só arte, é desafio, é superação, é adrenalina, é pura emoção. É tudo aquilo que fascina, satisfaz, ilumina ou glorifica.

Viver nada mais é que aproveitar, curtir, sorrir, brincar ou amar. É seguir em frente sem precisar voltar. É correr, partir sem rumo, sem se drogar ou usar fumo. É pisar na areia fofa ou tocar na pedra gelada, se molhar num igarapé ou piscar para a namorada. É o calor vindo do sol, a beleza provinda da natureza.

Nada mais é que estar intensamente em sintonia com os seus semelhantes, seus amigos e até a amante. É a troca de gestos, da companhia singela do abraço apertado, do beijo acalentado. É toda descrição indescritível, é a prosa com poesia, ou a poesia sem rima, é o visível invisível ou o som inaudível.

Pode ser a água limpa, o branco sem sujeira, a parede com acabamento, a nota sem valor, a amizade do momento. Viver é o andar pausado, o andar rápido, a passos largos, é o aspirar do pulmão, é o batimento do coração. Viver é como saborear frutas deliciosas, comidas saborosas, matar a sede, ou soltar um bocejo.

É aquele frescor vindo dos ventos, aquele som vindo dos pássaros, a sensação sem sensação, a dor sem dor, a cor sem cor. É o perfumar das flores ou a sombra de uma árvore. Viver é também, sofrer, ferir-se, cuidar, chorar, aprender, evoluir, e ensinar. É o presente que não vem em caixa, é a música que não precisou ser composta, é a cura sem vacina, o descanso da alma, é menino ou menina.

Viver bem é VIVER a vida, com o máximo de bom senso e sabedoria.

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Texto originalmente escrito em 21 de junho de 2006.





Aspas do Autor:  Em cinco anos de escrita, presenteio vocês aqui com um texto antigo, lá de 2006. Um texto doce sobre o viver. E queria esclarecer que não fiz cinco anos de blog, como alguns pensaram, mas cinco anos de escrita. Este blog aqui, "Elos no Horizonte", tem apenas dois anos e meio. Nos dois anos e meio iniciais, escrevi em outro blog. Bem, obrigado a todos pelas palavras de carinho. Deixo aqui o meu sincero afeto.

Festa!

4 de dezembro de 2010






Aspas do Autor: Bem, não há muito o que falar. Se for começar a me conhecer de anos atrás, o meu crescimento é perceptível ao longo dos textos em que escrevo. Não apenas o meu aprimoramento na escrita, mas principalmente o meu aperfeiçoamento na alma, como ser humano. Fica aqui o meu sincerto afeto à todos que me visitam. Espero que eu possa estar por aqui por bastante tempo, cativando e sendo cativado.